Acidente nuclear de Fukushima — 12 anos depois
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Acidente nuclear de Fukushima — 12 anos depois

    NHK World
    Correspondent
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    Em 11 de março, fez 12 anos desde o megaterremoto seguido de tsunami de 2011, que devastou amplas áreas da região nordeste do Japão. Esta reportagem é parte de uma série especial que explica a situação atual na província de Fukushima, de modo particular na usina nuclear Fukushima 1, que é administrada pela Companhia de Energia Elétrica de Tóquio (Tepco).

    Em 11 de março de 2011, estavam em funcionamento três dos seis reatores do complexo. Com o gigantesco tsunami desencadeado pelo terremoto de magnitude 9, a água do mar inundou quase todos os prédios dos reatores. O sistema de resfriamento dos reatores 1, 2 e 3, em operação, entrou em colapso, causando derretimento nuclear nas três unidades.

    A acumulação de hidrogênio produzido pelos reatores 1 e 3 provocou explosões nos seus prédios. O hidrogênio passou, então, do reator 3 para o prédio do reator 4, que também sofreu uma explosão. A cadeia de incidentes liberou um volume gigantesco de radiação.

    O descomissionamento da usina

    Prevê-se que o trabalho de descomissionamento da usina nuclear venha a levar até 40 anos. O processo consiste no desmanche do complexo, sem agravamento do risco representado pela radiação. O governo japonês e a Tepco elaboraram um roteiro formado basicamente por três estágios. O trabalho passa agora para a segundo estágio, e as autoridades estudam o momento certo para remoção dos resíduos de combustível nuclear que permanecem nos reatores. No primeiro estágio, os reatores foram colocados em base estável. A partir de agora o descomissionamento entrará em sua plena escala. Apesar do avanço, ainda não foram superados desafios tecnológicos presentes no trabalho que está previsto para o terceiro estágio.

    O maior desafio

    O maior obstáculo é remover a mistura de combustível nuclear derretido com componentes estruturais que forma os escombros no interior dos reatores. O uso de robôs foi experimentado dentro do vaso de contenção de cada reator nuclear. Obteve-se algum sucesso no reator 2, onde se constatou, em 2019, a existência de sedimentos semelhantes a resíduos radioativos.

    Para a segunda metade do ano fiscal de 2023, a Tepco planeja a realização de um teste em escala reduzida para averiguar a viabilidade de remoção dos escombros do reator 2. Inicialmente prevista para começar em 2021, a tarefa foi adiada duas vezes. Não está claro quando será feita a mudança da etapa de preparação e avaliação para o trabalho efetivo de remoção, nem tampouco há um plano detalhado para a remoção da totalidade dos escombros.

    Plano para a água tratada

    O trabalho de descomissionamento é em geral descrito como uma batalha contra águas acumuladas. A água usada para resfriar resíduos de combustível nuclear torna-se altamente contaminada e se mistura com água subterrânea e água pluvial que se infiltram pelas estruturas dos reatores. Em média, 100 toneladas desta água são geradas a cada dia.

    A Tepco remove a maioria das substâncias radioativas, mas o isótopo de hidrogênio trítio é de difícil filtragem. O trítio residual da água tratada também existe em fontes hídricas naturais — por exemplo, chuva ou mar —, bem como na água da torneira. Água com trítio é gerada em usinas nucleares que funcionam normalmente. Várias nações têm normas que estabelecem a concentração de trítio permitida em qualquer água lançada no mar — prática comum em países com usinas nucleares.

    Tratamento de água contaminada em um dos reatores da usina Fukushima 1

    O governo japonês definiu um plano para a Tepco diluir a água armazenada na usina antes do seu lançamento no oceano. A água será diluída até que a concentração de trítio seja inferior a 1/40 do nível estabelecido em normas nacionais e cerca de 1/7 do nível máximo recomendado para ingestão pela Organização Mundial da Saúde. Atualmente, há mais de mil tanques de armazenamento na usina. Prevê-se para breve o esgotamento da sua capacidade.

    Em janeiro de 2023, foi definido um plano para iniciar a descarga no mar em meados deste ano. A construção de dutos submarinos para o escoamento da água começou no ano passado.

    Contudo, pescadores locais preocupam-se com possíveis danos à reputação do setor.

    O governo japonês diz que não descartará nada proveniente da usina danificada sem que haja consenso para tal entre as partes afetadas. Está em curso uma campanha de esclarecimento público, com anúncios de jornal e televisão, sobre a segurança do lançamento da água no mar. Além disso, está sendo criado um fundo especial para auxiliar o setor pesqueiro.

    Os mais de mil tanques de armazenamento da usina estão quase repletos

    Danos à reputação

    Desde o acidente nuclear, os setores agropecuário e pesqueiro da província de Fukushima enfrentam a forte desconfiança dos consumidores, embora seus produtos atendam aos padrões nacionais de segurança. Empresas de turismo também foram prejudicadas. Autoridades locais preparam uma campanha de marketing que vai promover mundialmente os alimentos de Fukushima.

    O governo japonês publica regularmente a flutuação de preços de seis produtos alimentícios principais: arroz, carne bovina, pêssego, caqui semisseco, pimenta e linguado, com base em informações do mercado atacadista de Tóquio. Os dados mostram que, após o acidente nuclear, os preços dos produtos de Fukushima despencaram no Japão. O preço do caqui da região caiu para menos da metade da média nacional, enquanto o do pêssego da província caiu mais de 40%.

    Dois anos atrás, o preço do linguado e da pimenta de Fukushima subiu para a média nacional pela primeira vez após o acidente, mas o de outros produtos permanece 10% ou 20% inferior à média.

    Autoridades de Fukushima esforçam-se para reparar os danos causados à reputação da província. Testes exaustivos de radiação são feitos em diversos alimentos, incluindo arroz colhido em dez municípios próximos à usina. Pescados capturados em águas ao largo da costa são submetidos a testes aleatórios.

    Demolição de moradias, descontaminação de imóveis e terrenos

    O governo japonês está executando um projeto de demolição de prédios não mais habitáveis e de descontaminação de habitações e terrenos com base em contratos e solicitações de proprietários. É parte de esforços para reabilitar áreas que moradores foram obrigados a abandonar. Autoridades dizem que a remoção de radiação pode ser eficaz.

    Até o final de 2022, o Ministério do Meio Ambiente do Japão havia demolido cerca de 17.380 prédios — o correspondente a mais de 96% das solicitações recebidas.

    O trabalho de descontaminação consiste na remoção de substâncias radioativas de espaços residenciais por meio da retirada de terra e plantas — e do subsequente recobrimento com solo — ou da varredura antirradiação de telhados e paredes de prédios. O objetivo de longo prazo é diminuir a exposição para menos de 1 milisievert por ano — nível de radiação que especialistas consideram não prejudicial.

    Grandes sacos de resíduos radioativos empilhados na província de Fukushima — foto de 2016

    O governo japonês iniciou o trabalho de descontaminação na província de Fukushima logo após o acidente, com a remoção de terra da superfície, da lavagem de vias públicas e telhados e do corte de vegetação. Grandes sacos de resíduos radioativos foram empilhados em áreas de armazenamento temporário espalhadas por toda a província. Em alguns casos, os sacos foram temporariamente armazenados em pátios de escolas, parques, estacionamentos e até mesmo no jardim de residências particulares. Realizado em 44 dos 59 municípios, o trabalho prossegue em zonas designadas de “difícil retorno”.

    A usina nuclear Fukushima 1 ocupa áreas de ambas as localidades de Okuma e Futaba

    Grande parte dos resíduos radioativos foi enviada para um local de armazenamento provisório com área de 1.600 hectares nas localidades de Okuma e Futaba, que abrigam a usina. No local, plantas e material incinerável são transformados em cinzas. Solo, pedras e cascalho são removidos e armazenados em outros lugares. Trata-se de resíduos que deverão ser descartados fora da província de Fukushima, nos termos de um acordo firmado pelo Ministério do Meio Ambiente com as prefeituras de Okuma e Futaba e o governo provincial. A exigência foi feita em troca da sua concordância com a construção da área de armazenamento provisório que o ministério havia solicitado.

    Os resíduos radioativos são enviados para um local de armazenamento provisório com área de 1.600 hectares

    O Ministério do Meio Ambiente traçou um plano de reaproveitamento do solo em uma infinidade de obras públicas e para outras finalidades em todo o Japão. A precondição é de que a concentração de substâncias radioativas no solo fique abaixo do limite nacional. Três quartos do solo armazenado já estão abaixo do limite. O restante será reduzido em volume, transportado para fora da província e definitivamente descartado.

    O ministério fez um experimento de uso do solo para elevar o nível de um terreno e cultivar vegetais em alguns locais de Fukushima. Fora da província, a pasta demonstrou que o volume de radiação não seria problemático ao dispor jardineiras com amostras do solo na entrada de um prédio ministerial em Tóquio. Em dezembro de 2022, autoridades do ministério anunciaram a realização de projetos experimentais fora da província. Explicaram que a segurança havia sido confirmada por meio de atividades da pasta na província de Fukushima.

    Os projetos experimentais serão executados em três locais relacionados ao Ministério do Meio Ambiente. Reuniões foram realizadas para explicar os experimentos aos moradores locais, mas pessoas presentes demonstraram preocupação com a segurança.

    Público ainda cético

    Os habitantes de Okuma e Futaba tomaram a difícil decisão de aceitar a construção da área de armazenamento provisório. O governo do Japão prometeu a mais de 2.300 proprietários de terrenos que, até março de 2045, fará o descarte definitivo dos resíduos em áreas fora da província. No entanto, habitantes de outras partes do país se recusam a aprovar até mesmo projetos experimentais, o que desperta dúvidas, na província de Fukushima, quanto à possibilidade de cumprimento da promessa pelo governo nacional.

    Autoridades japonesas esperam que evidências científicas sirvam para persuadir a opinião pública, mas há poucos sinais de que isto venha a acontecer.